segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Profissionais da esmola

“Ganha um pastel na feira para mim. Quero de frango com catupiry”, berra Maria (nome fictício), de 36 anos, à filha A., de 12 anos. A menina ajeita o vestido e vai à barraca de pastel. “Tia, me dá um pastel? Tô com fome.” A mãe aguarda sentada na calçada enquanto fuma um cigarro e conversa com outras mulheres.

Em 24 dias, que começaram a ser contados em 1º de dezembro, Maria pretende ganhar pelo menos R$ 2 mil na esquina de uma das ruas mais chiques de São Paulo, a Oscar Freire, pedindo esmolas durante o dia e olhando carros à noite, sempre com a ajuda das filhas. “As pessoas se sensibilizam”, explica a mãe.

Nesta época do ano, segundo a Sociedade dos Amigos e Moradores do Bairro de Cerqueira César (Samorcc), o número de mendigos profissionais triplica na região. Até o dia 24 deste mês, Maria não volta para a casa onde mora de aluguel em Itaquera, na zona leste. Seu endereço, até a véspera de Natal, será a calçada da Rua Padre João Manuel com a Oscar Freire, dividindo espaço com outros “profissionais” da esmola.

De segunda a quinta, são seis. Nos outros dias, de maior movimento, chegam a 20, às vezes mais. A reportagem do JT esteve lá na quarta-feira e contou seis adultos. No dia seguinte, havia 17 adultos e oito crianças aglomerados.

“Neste mês, a associação recebeu mais de 50 reclamações por causa dessas pessoas. Eles falam palavrão, sujam as ruas e, em alguns casos, intimidam moradores e frequentadores quando vão pedir dinheiro”, afirma a presidente da Samorcc, Célia Cândida Marcondes Smith.

Todos têm endereço fixo: moram nas periferias das zonas leste, norte e sul. Têm casa equipada com fogão, geladeira, TV e, em alguns casos, freezer e até home theater. Celular é indispensável.

“A gente tem que aproveitar este mês para garantir um Natal com comida, presente para as crianças e pagar as contas”, diz Maria. Há 8 anos, ela passa o mês de dezembro no bairro: as crianças vendem panos de prato e balas nas Ruas Oscar Freire, Augusta, Consolação e Alameda Lorena.

Para moradores e lojistas, a culpa da proliferação de pedintes nesta época de compras e festas é das pessoas que dão esmolas. “São as maiores culpadas porque ajudam. Não dou nada porque trabalho dez horas por dia, enquanto essas mães exploram seus filhos”, afirma a secretária Eda Cludi, de 65 anos.

O vereador Floriano Pesaro (PSDB), que foi secretário municipal de Assistência Social, afirma que quem dá esmola estimula o trabalho infantil e é corresponsável porque “está tirando o futuro de uma criança”. Ele é o criador da campanha “Dê mais que esmola. Dê futuro”, já extinto.

A professora do curso de Assistência Social da PUC-SP Márcia Aparecida Accorsi Pereira pondera: “É uma estratégia dessas pessoas para sobreviver. Se houvesse políticas públicas adequadas, elas não sairiam de suas casas na periferia e se submeteriam a situações como essas”.

Combate ao trabalho infantil

A Secretaria Municipal de Assistência Social afirmou, por nota, que desenvolve ações que combatem o trabalho infantil na capital.

“Esse trabalho possibilitou que crianças e adolescentes saíssem das ruas e hoje são beneficiárias do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti). Para conceder o benefício, o Peti determina, entre outras condicionalidades, frequência mínima de 85% na jornada escolar e afastamento definitivo do trabalho e a participação das famílias em ações socioeducativas”, diz a nota.

A pasta, no entanto, não respondeu quantas famílias estão inscritas no programa atualmente.

Procurado, o Conselho Tutelar de São Paulo informou que todos os seus conselheiros estavam em uma convenção em Votuporanga, no interior de São Paulo, e não poderiam atender.

*com informações publicadas no Jornal da Tarde

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