segunda-feira, 19 de março de 2012

Mercado de imóveis usados trava após disparada de preços

Apesar da oferta recorde em Curitiba, a velocidade dos negócios no ramo despencou a partir de outubro

O mercado imobiliário curitibano caminha para corrigir uma distorção que apareceu nos últimos anos: o preço dos imóveis usados disparou a ponto de estar, em muitos casos, próximo do valor cobrado por unidades novas. Isso em um momento em que mais casas e apartamentos estão sendo colocados à venda – desde fevereiro de 2011, mais 2 mil imóveis receberam a placa de “vende-se” –, o que, em teoria, deveria ter segurado os preços. Um reflexo da valorização, que somente no último ano foi de até 26%, é que os negócios estão sendo fechados em um ritmo mais lento do que no ano passado. Hoje, a cidade tem mais de 16 mil imóveis residenciais usados à venda e poucos no mercado apostam que os preços vão continuar subindo

Curitiba nunca teve um volume tão grande de imóveis usados à venda, mas mesmo assim os preços subiram até 26% no último ano. O resultado dessa combinação – que desobedece à lei de oferta e demanda – é que os negócios já não saem com a mesma facilidade.

Um sinal de que a luz amarela acendeu para esse setor veio pela queda na Velocidade de Venda de Imóveis Usados (VUSO), índice que mede a porcentagem de unidades vendidas em relação à oferta disponível. O indicador atingiu 3,5% em janeiro, o pior resultado da série histórica do Instituto Paranaense de Pesquisa e Desenvolvimento do Mercado Imobiliário e Condominial (Inpespar), vinculado ao Sindicato da Habitação e Condomínios do Paraná (Secovi-PR).

Segundo Luiz Fernando Gottschild, presidente do Inpespar, o indicador subiu um pouco em fevereiro, para 4,9%, mas ainda assim está bem abaixo do mesmo período do ano passado, quando estava em 6,3%.

Desde fevereiro de 2011, pelo menos 2,6 mil unidades passaram a exibir placas de venda na cidade, quase o mesmo volume de imóveis novos entregues pelas construtoras nesse intervalo. Hoje há 19,4 mil unidades à venda, das quais 16,2 mil residenciais.

Mas, ao contrário do que se esperava, o ritmo de valorização dos usados continuou e praticamente acompanha o dos lançamentos. Para o empresário Hamilton Franck, ex-presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon), trata-se de uma distorção. Em média, a partir do quinto ano de existência, um imóvel custa entre 30% e 40% a menos que um lançamento de mesmo porte no mesmo local. “O que se vê hoje é um valor 5% menor do que o novo. E grande parte dos preços estão no mesmo patamar de valor dos novos”, diz.

Ajuste

O primeiro sinal de que os negócios estavam mais devagar veio em outubro, quando a velocidade de venda despencou de 7,6% para 4%. “Hoje a velocidade de venda é a metade da que seria considerada ideal”, diz Luiz Carlos Borges da Silva, sócio-proprietário da imobiliária Outrasul. De acordo com ele, o tempo para concretização da venda – em média de dez meses – pode atingir até dois anos. “O dono do imóvel está tentando impor preços e o comprador não está aceitando. Preço acima do valor de mercado não vende”, diz.

Para Marcos Kahtalian, da Brain Consultoria, especializada no mercado imobiliário, esse é um comportamento, embora equivocado, muito comum. “É natural que o proprietário se empolgue e ache que seu imóvel vale tanto quanto o novo, mas é o mercado que vai dizer se aquele valor é justo”, diz.

A percepção dos empresários do setor é que os negócios devem continuar pressionados, já que a oferta de usados tende a crescer até o fim de 2013. Alguns apartamentos usados que ainda vão a mercado estão hoje nas mãos de pessoas que vão usá-los para honrar o pagamento dos imóveis novos. Este ano e o próximo serão o pico de entregas dos imóveis novos que foram lançados há dois, três anos.

Para Carlos Paulino, vice-presidente da área de compra e venda e lançamento do Secovi, o problema não é a queda da demanda. Segundo ele, com os preços em alta, o comprador acaba adiando a decisão de compra e pesquisa mais, inclusive comparando os valores dos usados com os dos lançamentos. “O setor passa por uma acomodação, mas tem condições de crescer em patamares saudáveis. Mas terá que oferecer preços compatíveis com o mercado”, diz.

Economista vê bolha e risco de desvalorização

Depois da forte valorização dos preços nos últimos anos e dos sinais de que o comprador não pretende suportar mais um ciclo de alta de preços, existe a possibilidade de um recuo generalizado nos valores dos imóveis?

Para o economista e pesquisador especializado em Macroeco­­nomia Luciano D’Agostini, que acredita que haja um bolha no setor, alguns fatores podem fazer com que a demanda por imóveis recue, a inadimplência suba e os preços caiam. Um eventual au­­mento da taxa de desemprego, hoje em níveis historicamente baixos, pode comprometer o orçamento das famílias, que nunca estiveram tão endividadas. “Com o alto grau de endividamento, qualquer aumento da taxa de desocupação, ainda que sensível, é capaz de causar problemas”, diz.

Segundo ele, pelo menos dois fatores indicam, tecnicamente, a existência de uma bolha: o rápido e vigoroso crescimento do crédito, acima do ritmo de avanço real da renda, e o alongamento das parcelas de pagamento, ainda com juros altos. “Esses fatores criam uma ilusão monetária que é uma característica em mercados que tiveram bolha”, diz.

Para ele, há risco de queda de preços dos imóveis nos próximos anos. “Uma queda de 15% significa uma bolha fraca. Se chegarmos a 35%, teremos uma bolha moderada”, afirma. A percepção de que os preços do imóveis atingiu valores infundados também pode ser explicada, segundo o economista, pelo descasamento dos preços do imóvel e do aluguel. Um apartamento hoje comprado por R$ 200 mil não consegue ser alugado perto de 0,7% de seu valor – algo em torno de R$ 1,4 mil –, o que mostra a distorção”, diz.

Marcos Kahtalian, consultor do Sinduscon no Paraná, acredita que não há bolha, mas que um eventual desaquecimento da economia, com perda de renda e do ritmo do consumo das famílias, pode frear as vendas do mercado imobiliário. “Mas bolha ocorreria se os preços tivessem sido inflados artificialmente, desconectados da realidade, o que não ocorreu”, afirma. Ele cita diferenças entre o modelo do mercado imobiliário no Brasil e nos Estados Unidos. “Lá o problema se deu com o ‘empacotamento’ da dívida, a criação de subprodutos do mercado, o que não existe aqui.”

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Mudanças

Investidor começa a vender e eleva oferta

As grandes imobiliárias já sentem as mudanças no mercado. “Com tanta oferta, o proprietário que colocar o preço lá em cima pode perder a venda para o imóvel novo. Muitas empresas prometem ao proprietários lucros que não se concretizam”, afirma Elaine Gonzaga, diretora-geral do grupo Gonzaga. Ela confirma que está mais difícil vender o imóvel usado. “Valorização rápida e venda imediata são uma ilusão”, diz.

A oferta deve crescer também porque imóveis que foram comprados por investidores na planta há dois, três anos, começam a entrar na carteira de venda das imobiliárias. Segundo Elaine, o problema é que alguns investidores mal preparados estão com dificuldade para honrar o financiamento e terão que colocar o imóvel rapidamente à venda. “São pessoas que pensaram que poderiam lucrar muito e especularam com o mercado. Compraram duas, três unidades em um mesmo empreendimento, apenas confiando na valorização e na facilidade de revenda.”

A empresária estima que, para vender rápido, esses proprietários correm o risco, na atual conjuntura de mercado, de ter de oferecer preços até abaixo do que pagaram pelo imóvel. Ninguém sabe ao certo o tamanho da participação desse tipo de investidor no mercado, mas esses imóveis já aparecem na carteira de algumas imobiliárias.

“Alguns dias atrás vendemos um imóvel de investidor por R$ 290 mil, que estava sendo comercializado pela construtora por R$ 365 mil. Mas mesmo assim esse investidor está realizando lucro, pois pagou

R$ 220 mil na planta”, diz Jean Michel Galiano, superintendente da Apolar Imóveis, rede com 3 mil imóveis à venda, 10% mais do que há um ano. “Trata-se da volta à normalidade, o que já esperávamos. O problema é para quem acreditou que a euforia dos últimos três anos duraria para sempre”, diz Galino.

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Diferenças

Situação no interior é diferente

Em Londrina e Maringá, cidades do Norte do estado que também viveram nos últimos dois anos a forte expansão da construção civil, a situação é diferente da capital. Os preços dos imóveis também estão aumentando, mas a oferta não explodiu como em Curitiba.

Dados do Inspepar mostram que o volume de imóveis residenciais colocados à venda em Londrina avançou 9,6% em um ano, para 2,49 mil unidades. Em Maringá, a oferta até caiu (3,6%) e estava em 1,4 mil no mês passado.

O preço médio do metro quadrado em Londrina fechou fevereiro em R$ 1.870, 20% maior que no mesmo período de 2011. Em Maringá, além de a oferta ter diminuído, os preços também vêm subindo em velocidade menor. Em fevereiro, o preço do metro quadrado estava, em média, 11,5% maior do que no mesmo período do ano passado, em R$ 1.925,93.

Velocidade

A oferta comportada e a demanda crescente garantem boa velocidade de vendas, segundo Teo Granado, vice-presidente regional do Secovi no Noroeste. Segundo ele, o mercado recuou um pouco a partir de setembro, mas voltou a crescer no início deste ano.

“Muita gente adiou a compra por receio da crise, mas, comparando o primeiro trimestre deste ano com o do ano passado, que foi muito bom, as vendas estão estáveis”, afirma. Segundo ele, um imóvel na cidade costuma levar de três a dez meses para ser vendido.

*com informações publicadas na Gazeta do Povo

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